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O VIOLINISTA DO TITANIC

O VIOLINISTA DO TITANIC

ZARCILLO BARBOSA
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Ilustração do Titanic afundando, por Willy Stoewer


Enquanto o navio soçobrava em águas geladas, o violinista da pequena orquestra do Titanic decidiu tocar alguma coisa para acalmar os passageiros.


Escolheu a canção “Nearer, my God, to Thee” (Mais perto, meu Deus, de Ti). A letra diz, em tradução livre, que a cruz que Deus coloca sobre os nossos ombros, é para nos aliviar. Termina com a visão de uma escada que desce do céu e de anjos com acenos.


Sempre me emociono quando ouço esse hino do século 19, inspirado no sonho de Jacó (Gênesis). No Brasil de hoje, ouço ao longe os mesmos acordes plangentes do violinista do Titanic.


A diferença é que o meu país afunda num mar de irracionalidade política: o pandemônio na pandemia. O capitão desse navio chamado “Brasil”, confronta as cartas náuticas, segue no rumo do iceberg e põe em risco a vida de 211,5 milhões de passageiros.


Tudo sobre tchauzinhos dos querubins, consubstanciada na mídia nacional e estrangeira, diante do desastre quase inevitável.


Em apenas 27 dias tivemos dois ministros da Saúde. Nesse período o número de mortes aumentou 666%, coincidência ou não, o número da besta do Apocalipse. Apenas falta alcançar o feito de Donald Trump, nos Estados Unidos, para o Brasil chegar à indesejável liderança mundial pandêmica.


O presidente Jair Bolsonaro joga todas as fichas na politização de uma epidemia sem precedentes, ao declarar que só sai em 2027. Nem aí para o julgamento da história, ao fim dessa empreitada que tem tudo para dar errado. Afinal, o que está sendo confrontado é a própria Ciência.


O Palácio do Planalto tem sido uma usina de crises que só ajudam a desorganizar, mais ainda, a já fragilizada estrutura para enfrentar o grande inimigo virótico.


Em sua obsessão, o presidente prescreve hidroxicloroquina, quer o fim do distanciamento social e só aceita no governo quem se disponha a contrariar o consenso científico. Os militares, que até se conformam com algumas extravagâncias do presidente (“é o jeito dele”), rejeitam a possibilidade de alguém fardado no Ministério da Saúde. Tudo menos isso. As Forças Armadas ainda são a instituição de maior credibilidade no país. É um patrimônio que não se pode pôr em risco.


O Congresso Nacional, pusilânime, assiste de longe. O Judiciário não tem agilidade para conter o governante seduzido pelos próprios delírios.


“Deus no comando”, como dizem os crentes. Ele nunca nos dá um fardo maior do que possamos suportar. Oremos.


Zarcillo Barbosa é jornalista
proximarota
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