
FILHOS COM DUAS MÃES
ZARCILLO BARBOSA
Nos Estados Unidos, em vez dos filhos presentearem a mãe com flores ou objetos de uso pessoal, existe uma grande preferência pelos cartões de compras. De acordo com a pragmática americana, ela ficará muito mais satisfeita se puder escolher o seu próprio presente, sem erro de cor ou de numeração.
De posse do cartão, no valor de tantos dólares, mamãe vai à Macy’s, no dia que quiser e compra o que mais lhe agradar. Se ultrapassar o valor estipulado no dinheiro de plástico, pode completar, sem problemas.
Bem a propósito, vejo reproduzida da “New Yorker”, um cartum satirizando esse tipo de procedimento: a menininha pergunta à balconista – “Você tem algum cartão para duas mães? ”
Em tempos onde ainda persiste uma grande intolerância em relação à homossexualidade, a garotinha da ilustração dá a todos nós uma lição. Cientistas temiam que as crianças educadas por casais homossexuais sofressem abalos psicológicos. Pesquisas consolidadas na área da psicanálise infantil, concluem que elas não são nem mais felizes e nem mais infelizes do que as educadas por casais heterossexuais. Significa que não há crianças mais perturbadas entre os filhos de homossexuais do que entre os filhos dos heterossexuais. Nenhuma diferença essencial.
O problema é que, no fundo, nós pensamos que a função paterna e a função materna devem ser encarnadas por um homem e uma mulher, o que não é verdade. Acho que devemos sustentar tudo o que leve à igualdade dos sexos.
Minha mãe, era uma mulher simples. Deu à luz sete vezes. Cinco “vingaram”. Costumava rir da ideia de que o parto é um sofrimento maravilhoso. Para ela, era sim, um horror. Puro masoquismo.
De certa forma, sem saber, ia contra o mito do instinto maternal, segundo o qual, durante a gravidez as mulheres sentem pelo feto um amor irresistível e automático. Esse amor existe entre os macacos, mas não entre nós que temos um inconsciente, uma história e uma relação com os nossos pais.
Para a filósofa Élisabeth Badinter, o amor nasce no convívio com a criança. Radical, ela diz que a utilidade do mito materno é atribuir um papel às mulheres, um papel exclusivo. Para os homens, o poder, e, para as mulheres, a casa, o cuidado com as crianças, os trabalhos domésticos.
O feminismo que interessa é o que induz as mulheres à conquista. Neste dia, é necessário dizer para quem é mãe, para a que pretende ser e àquela que quer distância dessa ideia: “O mundo é seu. Vá em frente”.
*O autor é jornalista.