Chorar faz bem e é de graça
ZARCILLO BARBOSA
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Uma das grandes vantagens das mulheres sobre nós, homens, é a coragem de chorar em público. Se o choro vem, as mulheres não congelam as lágrimas, como os machos. Não guardam as lágrimas para depois ou as levam para derramá-las em casa, fechadas no quarto.
Eu procuro esconder, me envergonho. Mas choro. Debulho-me em lágrimas em filmes tristes ou de final feliz. Quando assisto a um casamento os meus olhos começam a ficar marejados desde a entrada da noiva na passarela, conduzida pelo braço do pai. Ao ouvir canto coral e até diante da televisão, com aqueles manjadíssimos reencontros de mãe com o filho sumido há quarenta anos, soluço feito criança.
Tem gente treinada a jamais derrubar uma lágrima. Fica plantado, com uma face de pedra sem nunca revelar seus sentimentos. Além de fazer mal ao coração, esses empedernidos não merecem confiança. E há, ao contrário, aqueles que choram profissionalmente, como os atores de cinema e tevê. É incrível como encarnam a desgraça do personagem a ponto de sentirem as dores descritas no script. Se o profissionalismo não chega a tanto, os maquiadores providenciam lágrimas de glicerina.
Por isso invejo as lágrimas sinceras das mulheres. Acho uma bobagem essas que usam terninhos – tailleurs, como se dizia com sotaque francês – ou “trajes forenses”. As advogadas são obrigadas à usarem vestimentas austeras no Fórum. Nada que mostre além do joelho. Sem decote revelador. Têm elas a pretensão de se mostrarem emancipadas e capazes de cuidar dos interesses dos clientes.
Hoje as mulheres ocupam quase todos os setores da atividade laboral. Conheci uma motorista de ônibus em São Paulo, que dirigia sem pudores. Xingava no trânsito feito homem mal-educado. Chamava a atenção dos passageiros inconvenientes, se preciso descia da boleia para tomar satisfação com qualquer macho. A linha de ônibus era mesmo infernal, embora ligasse o Paraíso à Consolação.
Estranha ironia. É a parte triste da emancipação feminina. Será que não dá para dirigir ônibus, caminhão, plataforma de petróleo, um país, seja lá o que for, sem perder a feminilidade? As redações dos meios de comunicação se transformaram em grandes matriarcados. É bonito ver a editora desconstruir os marmanjos que não cumprem com suas responsabilidades. Já vi repórteres chorando atrás da porta porque não aguentaram a descompostura da chefa. Elas também, muitas vezes não aguentam as pressões e desabam no choro, na frente de todo o pessoal sob seu comando. E daí? Chorar engrandece. Está em Mateus, 5,4: “Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.”
Lindas e comoventes as mulheres que choram. Desavergonhadamente. Em público, nas ruas, nos bares, nos restaurantes. Mesmo quando descobertas na infidelidade elas negam, em lágrimas. São antes de tudo, fortes. Se o contrário ocorre, se são traídas, abrem-se em prantos como uma personagem de Nelson Rodrigues. “Perdoa-me por me traíres”. Fazer amor depois da briga é sentir o sal da vida nas faces ainda umedecidas pelas lágrimas. Que deslumbre. “Ao anoitecer pode vir o choro, mas a alegria vem pela manhã” – Salmos, 30,5.
Coitados dos que escondem as lágrimas. Quando vir alguém chorando, deixe-o. Seja homem ou mulher. Mário Quintana advertia: “Não tentes consolar o desgraçado/Que chora amargamente a sorte má/ Se o tirares por fim do seu estado/Que outra consolação lhe restará? ”
Tem razão o poeta. Chorar é o melhor consolo. O homem que não chora tem mil razões para chorar.

Mara algodoal Vieira
Adorei não perco suas crônicas ????????
proximarota
Obrigado pelo prestígio, Mara!
Zuleika Lemos Gonsalves
Eu choro muito… sensibilidade, certamente. Ah, eu até aplicava castigos , nos próximos, e indicava e ou exigia a leitura da página “Heroína “ de Humberto de Campos, para os que não desenvolviam a contento os seus papéis, E aguardava o choro intenso dos leitores. Hoje estou mais serena, deixei de aplicar o castigo.
proximarota
“Um dia desses, eu separo um tempinho e ponho em dia todos os choros que não tenho tido tempo de chorar” (Carlos Drummond de Andrade). Grato pelo prestígio, Zuleika!